20 de dezembro de 2018
Discutir os efeitos da mineração e formular estratégias de resistência a projetos de grandes mineradoras foram alguns dos tópicos discutidos durante o II Seminário Regional sobre os Impactos dos Projetos de Mineração, ocorrido entre 13 e 15 de dezembro, em Rio Grande. O evento, promovido pelo ANDES-SN através da Regional RS do Sindicato Nacional, reuniu pesquisadores, docentes, estudantes, pescadores e agricultores familiares, além de ativistas ambientais.
A perspectiva de liberação das ações de mineradoras a partir de 1º de janeiro, com a posse do governo de Jair Bolsonaro, permeou diversas das falas – que acusaram preocupação com o que vem por aí. Coordenador do Movimento dos Atingidos pela Mineração (MAM), Márcio Zonta afirmou que as grandes mineradoras são empresas militarizadas e propagandísticas. “Se a propaganda não conquista corações e mentes, elas partem para aniquilar o inimigo. Já temos pescadores, camponeses, ribeirinhos e pesquisadores virando réus por se recusar a vender suas terras ou se opor aos projetos dessas empresas.” A pescadora Adenísia Sena, do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), veio do Espírito Santo dar seu depoimento sobre o que houve com a comunidade depois do crime ambiental da Samarco, em Mariana (MG). Ela contou que, além de baquear a subsistência dos pescadores, a lama causou danos mais graves. “A mineração chega sempre com muitas promessas, dizendo que vai dar tudo, mas não dá nada. Nossas águas e manguezais estão contaminados com minério. O que estamos passando é muito triste. Não sei se vou chegar aos 40 ou 50 anos com o nível de contaminação da água que estamos sofrendo.” Também foi exibido, em caráter de pré-lançamento, o documentário Dossiê Viventes – o Pampa viverá, projeto do Coletivo Catarse de Comunicação que aborda a luta contra a mineração de chumbo na zona do Rio Camaquã.
Projeto Retiro em debate
Tema trabalhado com bastante destaque durante o evento, o Projeto Retiro, da Rio Grande Mineradora, foi alvo de repúdio dos participantes. A empresa pretende extrair titânio e zircônio em São José do Norte, em uma faixa de 30 km entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico. Tanto pesquisadores quanto pescadores das comunidades afetadas reafirmaram sua disposição em combater o projeto.
Questões socioambientais perpassam o projeto, visto que, na área, além das comunidades de pescadores, há ainda sítios arqueológicos que devem se perder com a extração. Além disso, a biodiversidade do bioma Pampa e a inexistência de um banco de sementes das espécies nativas impedem a eventual recuperação do ecossistema.
Para o professor Eduardo Forneck, da Associação de Professores da FURG (Aprofurg), o tema está diretamente ligado às universidades, que são acionadas pelas mineradoras para fornecer laudos que deem credibilidade aos projetos em termos de impacto ambiental. “A universidade também está em disputa, uma vez que há pesquisadores que emprestam legitimidade e autoridade da universidade a essas empresas.” No último dia do evento, houve uma visita técnica dos participantes à Região de Retiro, em São José do Norte, para conhecer a área que a mineradora pretende explorar.
Rafael Kruter Flores, professor da Escola de Administração da UFRGS e representante do ANDES/UFRGS no evento, considera que o Seminário foi uma verdadeira atividade de extensão, trazendo a realidade cotidiana para dentro da Universidade. “Além disso, é fundamental colocar na pauta do dia um projeto altamente controverso e de alto impacto, que ainda não foi suficientemente discutido, como é o caso do Projeto Retiro.” Ao final do evento, foi publicada a Carta de São José do Norte.